Entidades se manifestam contra obra do Rodoanel

Entidades se manifestam contra obra do Rodoanel. Todos os presentes, menos o membro do governo, pedem que empreendimento seja retirado do projeto do acordo com a Vale.

Sargento Rodrigues (deputado estadual PTB/MG), João Magalhães (deputado estadual MDB/MG), Beatriz Cerqueira (deputada estadual PT/MG).

Com exceção do representante do Governo de Minas, todos os participantes da audiência da Comissão de Administração Pública sobre o Rodoanel se colocaram contra a realização dessa obra na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH).

Em reunião na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta terça-feira (13/7/21), membros de várias entidades apelidaram o empreendimento de “rodominério”, por favorecer o transporte das mineradoras. Além disso, consideraram-no extremamente danoso às comunidades do entorno e ao meio ambiente como um todo.

Único a defender o Rodoanel, o subsecretário de Transportes e Mobilidade da Secretaria de Estado de Infraestrutura e Mobilidade (Seinfra), Gabriel Ribeiro Fajardo, disse que o projeto ainda está em estudo. E que os interessados ainda podem apresentar propostas e dúvidas em relação ao Rodoanel, as quais serão avaliadas pela subsecretaria.

Ocupação – O jornalista Gustavo Gazzinelli, presidente do Instituto Diadorim, apregoou que “o traçado da obra é uma indução à ocupação urbana de todo o território”. Ele se posicionou contra o projeto da forma como vem sendo conduzido pelo Estado.

“Queremos um traçado que respeite áreas de preservação, ou então, tudo vai virar área conurbada”, alertou. Ele disse que, nos territórios ocupados ao longo do Rodoanel, a tendência é de que a vegetação seja suprimida, criando ilhas de calor e, consequentemente, reduzindo a qualidade de vida.

Outro ponto criticado foi a parceria público-privada (PPP) proposta pelo governo para viabilizar o empreendimento. Segundo ele, o Estado fez um traçado para atender a interesses empresariais e não aos da sociedade. “Se o governo muda o trajeto, as empresas começam a dizer que não vai render bons negócios”, refletiu. Na sua opinião, “o projeto nasceu ‘torto’, porque partiu do princípio de que tem que dar dinheiro, tornando-se insustentável.

Para a ambientalista Adriana Souza, a obra do Rodoanel vai promover a especulação imobiliária, gerando a ocupação desordenada 

Para a ambientalista Adriana Souza, a obra do Rodoanel vai promover a especulação imobiliária, gerando a ocupação desordenada – Fotos: Guilherme Dardanhan/ALMG

Insegurança hídrica – Para Adriana Souza, integrante do SOS Vargem das Flores, “o rodominério é uma obra hidrocida e ecocida”. Ela lembrou que o traçado do Rodoanel atinge áreas desse manancial localizado entre Contagem e Betim, na RMBH.

Ela destacou que a Vargem das Flores conta com biomas de Cerrado e Mata Atlântica e tem 2 mil nascentes, sendo responsável pelo abastecimento de 500 mil pessoas na RMBH. “Essa área de preservação estadual criada pela Assembleia em 2006 se torna ainda mais importante em função do crime que atingiu o Rio Paraopeba”, destacou.

A ambientalista alertou que a implantação do Rodoanel vai promover a especulação imobiliária por todo o traçado, gerando a ocupação desordenada. “A impermeabilização do solo vai secar as nascentes de Vargem das Flores, de modo que essa obra colocará em insegurança hídrica toda a Região Metropolitana”, profetizou.

Governo diz que está ouvindo a sociedade 

O subsecretário Gabriel Ribeiro Fajardo destacou que o projeto do Rodoanel, iniciado em fevereiro de 2020, promoveu estudos econômicos, sociais e ambientais, que foram colocados para avaliação da sociedade, por meio de consulta pública. Segundo ele, a consulta poderia ter apenas 30 dias, mas ficou aberta por mais de 80, em que foram recebidas 650 contribuições, ainda em análise pela Seinfra.

Ele acrescentou que foram realizadas cinco audiências públicas, quando a disposição legal seria de apenas uma. Ressalvou que, devido à pandemia, a participação de entidades foi toda virtual, mas que o governo pretende realizar novas reuniões.

“Estamos avaliando os pleitos da sociedade civil para incorporar alguns e repensar o projeto. A perspectiva é de finalizar a análise entre julho e agosto”, anunciou. Já o edital da obra, a ideia é que possa ser lançado até novembro para que em março de 2022 comece a licitação.

Brumadinho – Gabriel Ribeiro disse que o governo quer estruturar um projeto que priorize a geração de emprego e renda em Brumadinho. Afirmou ainda que, em parceria com a Defensoria Pública, a Seinfra está construindo um protocolo para utilizar nas desapropriações necessárias à construção do Rodoanel.

Destacou ainda que a Subsecretaria está construindo com a Secretaria de Estado de Meio Ambiente propostas de mitigação de impactos ambientais que a obra poderá causar. “Nossa ideia é buscar o licenciamento ambiental antes da licitação. Pensamos também em mitigadores ambientais, como passagens para a fauna e corredores ecológicos, vendo a forma ambientalmente correta de realizar os projetos”, concluiu.

Sobre a reforma do Anel Rodoviário, o secretário respondeu que essa via é da responsabilidade do governo federal. E que, quando o Rodoanel estiver pronto, o governo pretende restringir o acesso de caminhões ao Anel, direcionando esse fluxo para o Rodoanel.

Lideranças de Brumadinho dizem que comunidade não foi ouvida

Várias lideranças de Brumadinho (RMBH), onde ocorreu o rompimento da barragem da Mina do Córrego do Feijão, em 2019, condenaram a obra. Andressa Rodrigues, da Associação de familiares de vítimas e atingidos pelo rompimento, questionou quais melhorias o Rodoanel traria a esse público. “Hoje, temos trafego enorme de carretas, transporte de minério por trens e adoecimento da população, que não foi ouvida sobre o uso do dinheiro”, questionou.

Na opinião dela, o projeto atende às mineradoras e deveria ser financiado por elas. “Esse dinheiro do acordo não é da Vale, é do crime, do sangue das 272 joias que nos deixaram. Isso é uma afronta”, bradou.

Fernanda Perdigão, do Fórum de Atingidos pelo Crime da Vale em Brumadinho, considerou assustador o projeto por “destruir um dos poucos sítios agricultáveis da Região Metropolitana”.

Ela reclamou que não há previsão de investimentos na Bacia do Paraopeba para melhorar o escoamento da produção agrícola e em projetos de diversificação econômica. Também criticou o fato de 9 km da malha do Rodoanel passarem pelo município, desapropriando muitas famílias.

Inviabilidade – Já Joceli Andrioli, dirigente do Movimento dos Atingidos por Barragens, considerou ditatorial a atitude do governo de propor o Rodoanel, “uma estrada sem viabilidade técnica, ambiental e social”.

Conforme expressou, R$3,5 bilhões serão retirados da indenização do Estado e passarão para uma empresa fazer a obra e depois cobrar “o pedágio mais caro de Minas”.

Euler de Carvalho, do Fórum Permanente de São Francisco, também considerou que o projeto não tem viabilidade técnica. E afirmou que a entidade não apoia o Rodoanel, defendendo como alternativa a reforma do Anel Rodoviário.

Marta de Freitas, do Movimento pela Soberania Popular na Mineração, questionou a propaganda do governo de que estaria aberto às sugestões das pessoas nesse projeto: “Não contou com a participação popular essa proposta de Rodoanel, que além disso, será construído com o sofrimento do povo de Brumadinho”.

Prioridades – Os parlamentares que solicitaram a reunião também se manifestaram. André Quintão (PT) considerou que não há um projeto amadurecido que mereça o emprego de R$ 3,5 bilhões e sem um debate aprofundado. “Minas tem 65% de estradas com conservação ruim. Será que a prioridade não seria a revitalização delas, especialmente do Anel?”, indagou.

Beatriz Cerqueira (PT) defendeu que o governo abandone o projeto do Rodoanel em função das várias pendências apresentadas. “Como vou votar num projeto para o qual faltam ainda muitas respostas?”, questionou.

Já Ana Paula Siqueira (Rede) considerou importante ouvir o Estado e as entidades sobre o “rodominério”, por se tratar de obra com grande impacto ambiental.