Escuta atenta é ferramenta para prevenir suicídios. Em audiência, Comissão de Saúde abordou impactos da pandemia de Covid-19 na saúde mental da população.

O papel da escuta atenta para a prevenção de casos de suicídio foi enfatizado por participantes de audiência pública realizada nesta quinta-feira (23/9/21). A reunião, da Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), abordou ainda os impactos da pandemia de Covid-19 na saúde mental.
Para a porta-voz do Centro de Valorização da Vida (CVV), Norma Moreira Oliveira, essa escuta sem emitir opiniões, embora pareça simples, cumpre função importante.
“A gente não tem encontrado alguém para nos ouvir. E o CVV faz isso. Quando a pessoa está angustiada, ela precisa ser ouvida com respeito. Não é uma escuta que aconselha e julga, é um ombro amigo para que a pessoa possa encontrar outro caminho que não o suicídio”, reforçou.
Ela contou que o CVV atua na prevenção ao suicídio e no apoio emocional por meio do trabalho de 4 mil voluntários espalhados pelo Brasil, tendo inclusive o número 188 para atendimento gratuito 24 horas por dia.
O coordenador do Projeto HELP!, Tindaro Lanes Magalhães, contou que, em cerca de quatro anos, a iniciativa tem ajudado diversas pessoas com o trabalho de 370 voluntários em Minas e 7.500 no Brasil.
Conforme contou, o projeto oferece palavras motivacionais e apoio por telefone (11 4200-0034) a quem precisa ser ouvido. “Amarramos cartinhas em árvores e viadutos com conteúdo motivacional e palavras de esperança”, relatou.
SUS – De acordo com a psiquiatra Dagmar Fátima de Abreu, é preciso unir esforços para buscar uma melhor assistência à saúde mental no Estado e no País a toda a população por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).
Ela explicou que a doença mental é multifatorial e tem nuances diversas. “O transtorno mental deve ter a mesma urgência de um infarto ou fratura”, afirmou.
“Existem momentos em que os pensamentos e as emoções se tornam tão dolorosos que parece ao indivíduo ser menos sofrido tirar a vida do que lidar com isso”, acrescentou.
Grupo atende enlutados por suicídio
Coordenadora do Grupo de Apoio a Enlutados por Suicídio na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Vivian Zicker, explicou que o enlutado por um suicídio vive um luto diferente.
“Gera sentimentos de vergonha, raiva e abandono. É um luto muito pesado. Por isso, o enlutado também precisa de cuidados porque o risco de ele também apresentar transtorno mental aumenta potencialmente”, contou.
Ela relatou que o grupo, criado em 2017, realiza reuniões online semanais e gratuitas para promover acolhimento.
Psicóloga enfatiza agravamento de transtornos na pandemia
Psicóloga na ALMG, Daniela Piroli enfatizou que a pandemia da Covid-19 traz muitas consequências para a saúde mental. “O isolamento social, o uso e o abuso de substâncias químicas como o álcool, a violência doméstica, o alto número de mortes pela doença e o luto agravam os quadros de transtornos mentais, com consequente aumento nas taxas de suicídio”, contou.
Ela salientou a importância de se debater exaustivamente o assunto. “Temos uma pandemia evidente e uma epidemia de transtornos mentais que, muitas vezes, é invisível porque ainda é um tabu falar do tema. O suicídio é fenômeno multicausal e complexo e, por isso, as soluções devem ser pensadas de modo interdisciplinar”, disse.
Daniela Piroli acrescentou que, diferentemente da curva da Covid que sobe e desce, os efeitos para a saúde mental de toda a população têm tendência de elevação e de seguir depois como um platô a longo prazo.
Órgãos ressaltam ações voltadas à saúde mental

Segundo o chefe da Divisão Operacional do 1º Comando Operacional de Bombeiros do Corpo de Bombeiros Militar, Kleber Silveira de Castro, a corporação é treinada para lidar com ocorrências ligadas a transtornos mentais de forma humanizada.
“A prevenção é fundamental, mas se chegar a um momento crítico, de um suicídio, vamos trabalhar com qualidade para atender à população. Numa crise, ligue para o 193”, afirmou.
A chefe da Seção da Academia de Bombeiros Militar de Minas Gerais, Vanessa Rodrigues, citou que oagravamento da saúde mental também ocorreu na corporação na pandemia, o que decorre, em sua opinião, de o trabalho ser essencial e não ter parado em momento algum.
Polícias Militar e Civil enfatizam trabalho
O chefe do Centro de Operações Policiais Militares da Polícia Militar (PM), Ricardo Gonçalves Pessoa Leite, salientou que a PM também atua nesses casos, muitas vezes, com o apoio dos Bombeiros.
A chefe-adjunta da Polícia Civil (PC), Irene Angélica Franco e Silva Leroy, comentou que a corporação, embora atue sobretudo na investigação, trabalha com a prevenção para o público externo e interno.
Ela comentou que a PC, ao trabalhar com crianças e mulheres vítimas de violência, por exemplo, consegue identificar casos em que há potencial de desenvolvimento de algum transtorno mental e encaminhar para a rede de proteção.
Governo – A secretária Executiva de Segurança Pública da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp), Tatiana Telles, disse que o governo se preocupa com a saúde mental dos servidores da área, que são impactados porque lidam diariamente com casos de violência.
Ela contou que, desde 2019, cerca de R$ 2 milhões foram investidos no projeto chamado “Cuidar bem de quem cuida”, do eixo valorização do servidor público.
Aumento do número de suicídios na Polícia Rodoviária Federal
Já a diretora social do Sindicato dos Policiais Rodoviários Federais no Estado de Minas Gerais, Fabrizia de Pinho Nicolai, disse que, em 20 anos, o suicídio aumentou 25% na corporação e é quarta causa de morte dos profissionais, atrás de acidentes de trânsito, doenças cardiovasculares e violência interpessoal.
Ela enfatizou que está em andamento um projeto de apoio psicológico e saúde mental aos policiais, além de campanhas de prevenção.
O chefe do Serviço de Assistência Social da 4ª Região Militar do Exército Brasileiro, Roberto Lúcio Corrêa de Abreu, comentou que o Exército, dado o acesso a armamentos, apresenta índice de suicídio acima da média.
“Foi criado um plano de assistência social que tem como um dos eixos a prevenção ao suicídio”, contou, reforçando a queda do número de suicídios com as medidas implantadas.
Deputados destacam importância do debate
Para o autor do requerimento da audiência e coordenador da Frente Parlamentar de Prevenção ao Suicídio, à Depressão e à Automutilação, deputado Charles Santos (Republicanos), é relevante debater o assunto em questão, sobretudo neste mês, em que se celebra o Setembro Amarelo, de prevenção ao suicídio.
“As dificuldades ligadas à saúde mental são antigas. Mas, neste momento, são agravadas pela pandemia da Covid-19”, disse. Ele reforçou que a ALMG tem preocupação constante com o tema e que diversos projetos de parlamentares que abordam o assunto tramitam atualmente.
De acordo com o deputado Doutor Paulo (Patri), o Brasil e o Estado têm taxas elevadas de suicídio. “A pandemia agrava a situação pelo isolamento social e pelo desemprego que estamos vivenciando”, disse.