ArcelorMittal continua sem previsão de fim de barragem

ArcelorMittal continua sem previsão de fim de barragem

Três anos após evacuar a área de risco, em Itatiaiuçu, mineradora ainda não tem projeto pronto para descomissionamento.

Moradores querem que auxílio seja prorrogado e que indenização seja paga para todos os atingidos pelos prejuízos provocados pela evacuação.

A ArcelorMittal BioFlorestas e Mineração, responsável pela barragem Mina de Serra Azul, em Itatiaiuçu (Região Metropolitana de Belo Horizonte), continua sem cronograma para o descomissionamento da barragem, que foi classificada, em fevereiro deste, no nível 3 de risco, o mais alto, que indica perigo de rompimento. O atraso e lentidão no processo foi admitido pelo diretor-geral da empresa, Wagner de Brito Barbosa, durante audiência pública, nesta segunda-feira (11/7/22), da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

A Lei Mar de Lama Nunca Mais, aprovada na ALMG depois do rompimento da barragem de Brumadinho (RMBH) em 2019, estipulava a data de 25 de janeiro de 2022 para a descaracterização de todas as barragens a montante em Minas Gerais, como é o caso da Serra Azul. Wagner Barbosa prevê que o plano para o esvaziamento da barragem fique pronto entre outubro e novembro. “Estamos caminhando devagar, mas estamos caminhando”, ressalvou.

Em função do risco de rompimento, já detectado em 2018, a empresa iniciou em dezembro daquele ano evacuação de moradores da zona de autossalvamento (Zas). Das 56 famílias que ainda hoje estão em casas alugadas, 25 foram realocadas na mesma região da localidade de Pinheiros, próximo à barragem, e os outros em outras áreas do município, de Igarapé (RMBH) e Itaúna (Centro-oeste de Minas).

O executivo da empresa informou que já está sendo construída uma estrutura de contenção à jusante (ECJ), para reter os rejeitos que devem ser retirados da barragem. Trata-se de uma barreira física, localizada a 2 km da Minas de Serra Azul, numa região desabitada. A estrutura prevê a instalação de cerca de mil estacas de aço cravadas no solo, de 30 a 70 metros de comprimento, além de concreto e pedras e a construção de uma galeria subterrânea para permitir que as águas do Córrego Mota continuem fluindo.

Diretor da empresa admite atraso nas negociações 

Diretor da empresa admite atraso nas negociações – Fotos: ALMG/Willian Dias

Segundo Wagner Barbosa, sem a conclusão da ECJ não é possível retirar os rejeitos da barragem. Enquanto isso, equipes de técnicos fazem contenções na estrutura, para evitar um possível rompimento. A estrutura também é monitorada 24 horas por dia e a empresa já conta com plano de emergência para casos de riscos. O plano indica, por exemplo, rotas de fuga, prevê a instalação de tanques adicionais de água, caso os rejeitos atinjam o reservatório do Rio Manso – responsável por 60% do abastecimento da RMBH.

A empresa também está fazendo levantamento sobre eventuais consumidores priortários para abastecimentos de água por caminhão pipa, para casos de necessidade. Além disso, um estudo está em andamento para avaliar os danos caso o curso d´água seja atingido, avaliando os impactos, o caminho da mancha de rejeitos, condições do reservatório e até capacidade tratamento.

O executivo afirmou que a intenção da empresa é retirar os cerca de 5 milhões de rejeitos que estão na barragem, tratá-los e direcionar o descarte do processo para barragens a seco. Ele tentou tranquilizar os participantes da audiência, ao afirmar que a Mina de Serra Azul está inoperante há 10 anos e que não há sinais de que possa romper.

Acordos de indenizações são cobrados

Moradores que participaram da audiência pública cobraram extensão dos auxílios que vêm sendo pagos aos atingidos, para outras 455 famílias que esperam pelo reconhecimento como beneficiárias. Segundo eles, essas pessoas também foram afetadas pela evacuação feita na cidade. Muitos perderam os empregos, sofrem com problemas de saúde, especialmente mental, como depressão, síndrome do pânico e ansiedade, e ainda com danos que continuam sendo provocados pelas explosões, como rachaduras nos imóveis. Luzia Soares de Souza defendeu que a reparação seja para todos.

Márcio da Piedade de Souza e Ezequiel Matias lembraram que alguns sitiantes continuam impedidos de voltarem para suas terras, o que impactou, também, em caseiros que empregavam. O processo imposto de mudança provocou separação de famílias, rupturas de convívios sociais e de rotinas, trazendo prejuízos financeiros e causando adoecimento das pessoas.

“Não se pode tratar o caso somente pelo fator econômico, nossa vida não pode ser reduzida a isso” – protestou Márcio. Para Ezequiel, a reparação indenizatória, ao menos, permitirá que comecem a colocar “a vida nos trilhos”.

A coordenadora Estadual da Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social (Aedas), que presta assessoria independente para os moradores de Itatiaiuçu, Jéssica Barbosa Siqueira Simões informou que 374 famílias estão em negociação individual com a empresa; 280 esperando agendamento e 94 com contratos já firmados. Os auxílios e pagamento das despesas dos deslocamentos foram acordados no Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), firmado sob anuência do Ministério Público.

Um segundo TAC está em fase de negociação para garantir reparações coletivas, que deverá incluir investimentos da mineradora em infraestrutura, espaços de lazer, projetos para recuperação econômica e planos para recuperar os laços comunitários interrompidos pela ação.

Jonas Vaz Leandro, do Ministério Público Federal, destacou que esse processo traz muitas inovações do ponto de vista das reparações, o que se deve, em sua opinião, ao respeito à participação dos atingidos e à assessoria técnica prestada desde o início.

Ao comentando essa fala, a deputada Beatriz Cerqueira (PT) avaliou que há uma distância entre a participação e a decisão. “Não adianta fazer 20 reuniões e a decisão ficar na mão de quem detém o poder econômico’’, disse ela, exemplificando com o fato de junta médica da Arcelor ter a palavra final na concessão de auxílios.

Provas impossíveis

Jéssica Simões reclamou que mesmo a ArcellorMittal tem dificultado o pagamento dos auxílios a alguns moradores impactados com a evacuação e o risco representado pela barragem, especialmente para casos de danos à saúde. Segundo ela, são exigidas “provas impossíveis” para confirmar que o adoecimento está relacionado aos eventos.

Ela citou o caso de um morador que morava na área da zona de autossalvamento e trabalhava num sítio, posteriormente alugado para moradia provisória das famílias removidas. Atualmente, com a saúde debilitada e dependente de oxigênio, ele não é acolhido pela mineradora que considerou que o acionamento da evacuação não o teria afetado.

Outra moradora, com deficiência auditiva, também foi desconsiderada pela empresa, sob a justificativa de que não teria ouvido a sirene para a evacuação. “Usou (a mineradora) a deficiência da moça contra ela mesma” – acusou.

Ao ser questionado por Beatriz Cerqueira sobre as exigências de provas difíceis de comprovação, Wagner Barbosa se esquivou dizendo não saber dos casos. A deputada também perguntou se a empresa não confia nos relatórios de saúde emitidos pro médicos do Sistema Único de Saúde (SUS), ao criticar a exigência da mineradora de comprovação dos problemas de saúde por uma junta da própria empresa.

O gerente jurídico da ArcellorMittal, Gustavo Pasa, afirmou que são aceitos atestados de outros profissionais, desde que comprovem que o dano tenha sido causado posteriormente ao acionamento da empresa.

Mas, segundo depoimentos de participantes, vários médicos que atuavam em Itatiaiuçu já não trabalham mais na cidade e os substitutos não concordam em fazer esses laudos. Outro problema apontado diz respeito à troca de funcionários da empresa que lidam com os atingidos. Dessa forma, pessoas acompanhavam as negociações desde o início foram substituídas por outras, inclusive terceirizados, que não conhecem todo o histórico e as propostas acordadas.

SITIANTES

Albino Dias, que é sitiante em Lagoa das Flores, reclamou da grande desvalorização de seu terreno e de seus vizinhos. Isso porque a mineradora colocou várias placas de alerta de risco na região, como “Rota de fuga” e outras, o que assusta qualquer pessoa que porventura pense em adquirir um terreno por lá.

Fonte: ALMG

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